Tão efémeras, as cumplicidades radiosas. Encontros de pele, de atmosferas, flutuando como nuvens para o paraíso do esquecimento. Acreditava que o sentido da minha vida estava nesses encontros, e confronto-me agora com a falta que tu me fazes. Tu roubas-me o sentido, viciei-me nesse roubo, talvez seja ainda um vício do sentido, o supremo. Nós nunca fomos cúmplices, sabíamos demais um do outro. Éramos promíscuos. Dedicávamo-nos a combater o pensamento um do outro para chegarmos à névoa humana. Traías-me, traíste-me inúmeras vezes e nunca chegavas a tocar a fímbria da traição. Diziam que eu te perdoava tudo. Como se iludiam. Nunca tive nada para te perdoar, vejo-o agora, com uma nitidez impossível. Gostavas dessa forma de intimidade rápida que é a discórdia. Eu também. Éramos imperdoáveis, seremos imperdoáveis um do outro, cascos naufragados no negro incêndio do mar.
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in Fazes-me Falta
Inês Pedrosa
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