Ela seria alta. O corpo seria longo, moldado de uma só vez, como se tivesse sido por Deus, com a perfeição indelével do acidente pessoal.
Não se pareceria, de facto, com ninguém.
O corpo é sem nenhuma defesa, é liso do rosto aos pés. Pede o estrangulamento, a violação, os maus tratos, os insultos, os gritos de ódio,o desencadear de paixões inteiras, mortais.
Olhas para ela.
É muito magra, quase grácil, as pernas são de uma beleza que não participa da beleza do corpo. Não têm implantação real no resto do corpo.
Dizes-lhe: Deve ser muito bela.
Ela diz: Estou aqui, olhe, estou à sua frente.
Tu dizes: Não vejo nada.
Ela diz: Tente ver, está incluído no preço que pagou.
Agarras no corpo, olhas para os seus espaços diversos, dás-lhe uma volta, mais uma ainda, olhas, uma vez mais ainda.
Desistes.
Desistes. Deixas de tocar no corpo.
.Até essa noite, ainda não tinhas percebido como se podia ignorar aquilo que vêem os olhos, aquilo que tocam as mãos, aquilo que toca o corpo. Descobres essa ignorância.
Dizes: Não vejo nada.
Ela não responde.
Dorme.
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in Textos Secretos
Marguerite Duras
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