quarta-feira, maio 04, 2005

Olhar

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Vais olhar para o que vês. Mas vais ter de olhar absolutamente. Vais tentar olhar até ao apagamento do teu olhar, até à sua própria cegueira, e através dela deves continuar a tentar olhar. Até ao fim.
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Perguntas-me: olhar o quê?
E eu digo, bem, digo o mar, sim, essa palavra, à tua frente, essas paredes à frente do mar, esses desaparecimentos sucessivos (...).
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Ouve. Penso também que se não olhasses para o que se te apresenta, isso se veria no ecrã. E o ecrã esvazia-se.
O que estiveres a ver ali, o mar, os vidros, a parede, o mar por detrás dos vidros, os vidros nas parede, nunca o terás visto nem olhado.
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Vais pensar que isto que se vai passar não é uma repetição, que é inaugural como é em si a tua própria vida a cada segundo que se desenrola (...).
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Saíste do campo da câmara.
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Estás ausente.
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in Textos Secretos
Marguerite Duras
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